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2. Em Werther, num dado momento, opõem-se duas economias. De um lado, há o jovem apaixonado que prodigaliza, sem contar o tempo, as faculdades, a fortuna de que dispõe; do outro, há o filisteu (o funcionário) que o ensina: «Divida o seu tempo... Calcule bem a sua fortuna, etc.» De um lado há o apaixonado Werther que gasta todos os dias o seu amor, sem espírito de reserva nem de compensação, e, do outro, há o marido Alberto, que administra os seus bens, a sua fortuna. De um lado, uma economia burguesa da repleção, do outro, uma economia perversa da dispersão, do desperdício, da impetuosidade (furor wertherinus).
(Um lord e depois um bispo inglês censuraram a Goethe a epidemia de suicídios provocada por Werther. Ao que Goethe respondeu em termos propriamente económicos: «O vosso sistema comercial tem causado milhares de vítimas, por que não tolera algumas ao Werther?»)
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4. Quando o Dispêndio de amor é continuamente afirmado, sem travão, sem interrupção, produz-se uma coisa brilhante e rara que se chama exuberância e que é igual à Beleza: «A exuberância é a Beleza. A cisterna retém, a nascente transborda». A exuberância de amor é a exuberância da criança na qual nada consegue ainda conter o desdobramento narcisista, a felicidade múltipla. Esta exuberância pode ser interrompida por tristezas, depressões, movimentos suicidas, pois o discurso de amor não é uma média de estados; mas um tal desequilíbrio faz parte desta economia sombria que me mostra a sua aberração e por assim dizer o seu luxo intolerável.
Roland Barthes - in Fragmentos de um discurso amoroso

