2007/11/23

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1. Como acaba um amor? - O quê, então ele acaba? Em suma, ninguém - a não ser os outros - sabe disso; uma espécie de inocência mascara o termo desta coisa concedida, afirmada, vivida segundo a eternidade. Suceda o que suceder ao objecto amado - quer desapareça quer passe ao mundo da Amizade -, nunca o vejo desvanecer-se: o amor que acaba afasta-se para um outro mundo, à maneira de uma nave espacial que deixa de cintilar: o ser amado ecoava como uma vozearia, ei-lo subitamente inaudível (o outro nunca desaparece quando e como se espera). Este fenómeno resulta de uma limitação do discurso de amor: não posso (eu, sujeito apaixonado) construir até ao final a minha própria história, tal como a minha própria morte, pertence aos outros; a eles cabe escrever o romance, narrativa exterior, mítica.

(...)

Uma vez que não me sinto realizado e não me mato, a vagabundagem de amor é fatal. O próprio Werther a conheceu - passando da «pobre Leonor» a Carlota; é verdade que o movimento foi travado; mas, se tivesse sobrevivido, Werther teria escrito de novo as mesmas cartas a uma outra mulher.


Roland Barthes - in Fragmentos de um discurso amoroso.