2007/11/27

Je vous souhaite une révolution!

«Será que se pode falar de uma ideologia burguesa para qualificar o conjunto de ambições que se inspiram na corrente iluminista para exigir uma mudança profunda? O termo passou de moda e, sem dúvida, por boas razões. Preferiu-se falar da cultura de uma "elite" em que se concetra, em consenso aparente, toda uma nobreza liberal e a parte esclarecida da burguesia na perspectiva de uma via reformista. Noção ambígua, que disfarça clivagens de tal modo profundas que virão ao de cima durante a Revolução. É que a filosofia iluminista foi difundida e como que cunhada em fórmulas simples. Uma literatura e estruturas de sociabilidade (as lojas maçónicas em especial) asseguram-lhe difusão. As ideias-chave das Luzes, cinzeladas em fórmulas simples - liberdade, igualdade, governo representativo -, vão encontrar no contexto da crise de 1789 uma oportunidade excepcional para se impor.
(...)
Trata-se um programa em que se associam a reivindicação política (controlar a pessoa do rei) e a reivindicação económica. A partir desta série de acontecimentos, podemos reflectir sobre o laço que une a revolução parlamentar, no topo, tal como se afirma na Assembleia Nacional, e a revolução popular na rua. É verdade que a burguesia tem muitas reservas quanto à violência popular e às formas brutais de luta pelo pão quotidiano. Mas, entre estas duas revoluções, há mais do que uma coincidência fortuita: foi graças à intervenção popular que a revolução parlamentar pôde materializar os seus êxitos e graças ao 14 de Julho que o rei, a partir de 16, teve de ceder, readmitindo Necker e, no dia 17, aceitando usar a insígnia tricolor, símbolo dos novos tempos.
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A interpretação desta viragem da Revolução não é fácil. Entre 1791 e queda da monarquia, a 10 de Agosto de 1792, a marcha revolucionária mudou de direcção: será isto o efeito de uma superação autodinânima e, afinal de contas, inevitável ou de uma convergência acidental de factores? Alguns historiadores - F. Furet e D. Richet - proposeram recentemente o tema da derrapagem da Revolução. Para eles, a intervenção das massas populares urbanas ou rurais no curso de uma Revolução liberal que conseguira os seus objectivos essenciais não estava na ordem das coisas. (...) Todavia, não leva em conta a importância do perigo contra-revolucionário, ao negligenciar a dureza das frentes de batalha em todo o país.»


Michel Vovelle - A Revolução Francesa, 1789-1799