2008/04/30

Cumprimentos dos mortos

Balançava com o autocarro quando se sentou à minha frente. Pela conversa, percebi que os ocupantes dos lugares que nos cerceavam seriam vizinhos também. Não tenho nenhuma memória dela. Mas sei dos comentários que lhe teciam (não sei se ainda tecem) e que a diziam "ordinária". Sempre. Antes e depois de lhe morrer o filho mais velho, ainda adolescente. Ao marido, sim, lembro-me de o ver. Homem bem aparentado, de cabelo de um grisalho orgulhoso, quase altivo, mostrava-se todas as manhãs quando saía para correr. Voltei a vê-lo há dias, a sair de uma garagem, numa cadeira de rodas.
Pelo caminho, pouco falou da casa nova. Comentou os vizinhos mais próximos e a D. qualquer-coisa, cujo marido era militar. Diz que militar, não. Tem uma pensão do exército, porque combateu no ultramar. Teve sorte, diz ela. Não foi como o marido que também lá esteve, mas só agora recebeu os cumprimentos dos mortos.