2008/06/18

Livre arbítrio

«O homem não pode nunca sair da obediência a Deus. Uma criatura não pode deixar de obedecer. A única escolha que, como criatura inteligente e livre, se oferece ao homem é a de desejar a obediência ou não a desejar. Se ele não a deseja, obedece todavia, perpetuamente, enquanto coisa submetida à necessidade mecânica. Se ele a deseja, permanece submetido à necessidade mecânica, mas uma necessidade nova se lhe acrescenta, uma necessidade constituída pelas leis próprias das coisas sobrenaturais. Certas acções tornam-se-lhe impossíveis, outras cumprem-se por seu intermédio, por vezes mesmo a despeito de si próprio.
Quando sentimos que em certa ocasião desobedecemos a Deus, isso quer simplesmente dizer que durante certo tempo deixámos de desejar a obediência. Claro que, em circunstâncias iguais, um homem não realiza as mesmas acções consoante tenha ou não consentido na obediência; da mesma forma que uma planta, em circunstâncias iguais, não cresce da mesma maneira consoante esteja à luz ou à sombra. A planta não exerce nenhum controlo, nenhuma escolha na questão do seu próprio crescimeno. Nós somos como plantas que tivessem como única escolha a de se exporem ou não à luz. (...)
Como se aprende a ler, como se aprende um ofício, da mesma forma se aprende a sentir em cada coisa, antes de tudo e quase unicamente, a obediência do Universo a Deus. Trata-se verdadeiramente de uma aprendizagem.»


Simone Weil - in Espera de Deus, Escritos, O Amor de Deus e a infelicidade