2008/11/11

Linhas com que nos coser

«Eis os outros pontos principais das crenças que professávamos em comum, meu pai e eu: - em política, uma confiança quase ilimitada na eficácia de duas coisas: o governo representativo e a liberdade completa de discussão. Meu pai tinha tão grande confiança na influência da razão sobre os homens, por toda a parte onde pudesse ser ouvida por eles, que acreditava que a vitória seria completa se toda a gente soubesse ler, se todas as opiniões pudessem exprimir-se pela palavra e pela imprensa, e se, graças ao direito de voto, o povo pudesse eleger uma Câmara legislativa que fizesse, das opiniões dominantes, leis. (...) pois o povo dirigido por homens ilustres faria boa escolha das pessoas que devem representá-lo, e depois disso daria liberdade completa àqueles que tivesse escolhido. Por esta razão condenava energicamente os principais aristocráticos e o governo duma oligarquia, fosse qual fosse a sua forma, e via nele o único obstáculo que impede ainda os homens de regularem os seus próprios interesses com toda a prudência de que são capazes.
(...) Só o que lhe parecia essencial era para ele importante: a forma do governo (república ou monarquia) deixava-o quase indiferente; já para Bentham o rei, pelo seu papel "essencialmente corruptor", era um personagem necessariamente prejudicial. O que mais lhe provocava ódio era, em primeiro lugar, a aristocracia; depois, uma igreja do Estado ou qualquer outra corporação de padres, que, pela sua posição, degradam a religião e cujo interesse é contrário aos progressos do espírito humano, o que não quer dizer que detestasse qualquer eclesiástico em pessoa, desde que não o merecesse; muito ao contrário, tinha verdadeira amizade por alguns.»


John Stuart Mill - in Memórias