2008/11/24

Wordsworth com Van Gogh


Bulb Fields, aka, Flower Beds in Holland (1883)
Vincent Van Gogh


«Esta posição das minhas ideias e dos meus sentimentos explica a influência da leitura, feita pela primeira vez no outono de 1828, de Wordsworth; foi um acontecimento importante na minha vida. Pus, por curiosidade, os olhos sobre as suas obras; não esperava nenhum alívio, embora tivesse já recorrido à poesia com essa esperança. (...) Mas, na conjuntura particular em que me encontrava, os seus poemas, tais como foram editados em 1815, a que ele não acrescentara nada de notável, eram o remédio para as minhas necessidades espirituais.
(...) Contudo, Wordsworth jamias exerceria grande influência sobre mim se se limitasse a apresentar belos quadros da natureza. Scott era nisso muito superior. E, ainda acima, está a visão directa de qualquer paisagem, mesmo de segunda ordem. Os poemas de Wordsworth foram um bom remédio porque deixaram ver, não a beleza exterior, mas os sentimentos e as ideias coloridas pela acção da beleza da natureza. Pareceram-me muito adequados à cultura dos sentimentos de que eu andava em busca. Sentia que eram uma fonte capaz de despertar a alegria da alma, os prazeres da sinpatia e da imaginação, onde toda a gente podia igualmente beber, pois a sua serenidade não era perturbada pelas lutas e pelas misérias da vida. Esta alegria aumentaria ainda, desde que melhorassem as condições físicas e sociais da humanidade. Eles eram para mim a revelação inesperada das nascentes eternas da felicidade, logo que os maiores males da vida desaparecessem. Sentia-me melhor e mais feliz, sob a sua influência.
(...)
Reconheci que Wordsworth experimentara as mesmas angústias que eu: tinha descoberto que a primeira onda de prazeres da vida, na juventude, não era duradoira, procurara uma compensação, e tinha-a encontrado na direcção em que me ensinava agora a procurá-la. Esta leitura arrancou-me gradualmente, mas de maneira completa, do meu estado habitual de depressão e, graças a ela, não voltei a cair nele. (...) Comparado com os maiores poetas, pode dizer-se que ele é o poeta dos temperamentos que não são poetas. Os temperamentos calmos e contemplativos, mas despidos de sensibilidade poética, são exactamente aqueles que têm necessidade de cultura poética; e Wordsworth é mais capaz de lha dar que outros, no fundo, mais poetas que ele.»


John Stuart Mill - in Memórias