2009/01/29

«Ora, a diferença que separa estas duas escolas filosóficas, a da Intuição e a da Experiência e Associação, não é uma simples questão de especulação abstracta; é, ao contrário, cheia de consequências práticas e encontra-se na base de todas as divergências de opinião acerca de problemas práticos, numa época de transformação. O reformador prático não deixa de reclamar mudanças nas coisas que se apoiam em sentimentos fortes e muito difundidos. Tem de saber se os factos estabelecidos, que parecem necessários e indefectíveis, o são realmente. (...) Há, pois, uma hostilidade natural entre o reformador e uma filosofia que não explica os sentimentos e os factos naturais pelas circunstâncias e pela associação, preferindo considerá-los como elementos primários da natureza humana. Vê erguer-se contra si uma filosofia que concebe as suas doutrinas como revelações da intuição, e que reconhece na intuição a voz da Natureza e de Deus, a qual se apresenta como autoridade superior à da nossa razão.
Quanto a mim, a tendência dominante que nos leva a considerar as diferenças de carácter dos homens como inatas e indestrutíveis e nos leva a não ter na devida conta as provas irrefutáveis, demonstrativas que a imensa maioria dessas diferenças, tanto nos indivíduos, como nas raças e nos sexos, poderia ser, e é de facto, o efeito das circunstâncias - penso, que esta tendência é um dos mais sérios obstáculos ao estudo das grandes questões por processos racionais, e o mais irremovível para o progresso da humanidade.»


John Stuart Mill - in Memórias