2008/01/16

Deísmo

«Felizmente, podemos encontrar todas estas circunstâncias no assunto da religião natural. Que verdade será tão óbvia, tão certa, como a existência de um Deus, que foi reconhecida nas épocas mais ignorantes e para a qual os génios mais refinados se esforçam ambiciosamente por produzir novas provas e argumentos? Que verdade será tão importante como esta, que é a base de todas as nossas esperanças, o fundamento mais seguro da moralidade, o apoio mais firme à sociedade e o único princípio que nem por um só momento deve estar ausente dos nossos pensamentos e meditações? Mas ao tratar desta verdade óbvia e importante, que questões obscuras nos ocorrem sobre a natureza desse ser divino, sobre os seus atributos, sobre os seus decretos, o seu plano de providência? Estas questões estiveram sempre sujeitas às disputas dos homens, a razão humana não alcançou qualquer conclusão certa a seu respeito, mas estes assuntos são tão interessantes que não podemos deter a nossa investigação sobre os mesmos, ainda que por agora só a dúvida, a incerteza e a contradição tenham resultado das nossas pesquisas mais rigorosas.»


David Hume - in Diálogos sobre a Religião Natural (1776)


«Houve várias formas de deísmo, todas conotadas com algum tipo de heterodoxia religiosa, em contraste com o que costuma ser chamado "teísmo", termo genérico que designa as várias formas ortodoxas de religião. Mas na época clássica o conceito predominante de deísmo era a simples convicção de que Deus, ou a Primeira Causa, criou o mundo e com ele em conjunto de leis imutáveis para o reger. É apenas isto. É pouco? Todos os teístas só podem pensar que o é, mas a reposta do deísta é que isso é tudo o que podemos saber, sendo blasfémia a pretensão de saber mais do que isso. Conhecer Deus é apenas saber que ele existe e criou este mundo regido por leis - ou, na expressão de Séneca citada nos Diálogos, "conhecer Deus é adorá-lo".


João Paulo Monteiro - in Obras sobre Religião (David Hume), Introdução.